Renato Russo testando os primeiros movimentos da Colômbia 8a na Fazenda Invernada em 2006. |
A natureza das duas atividades é bem distinta, mas a finalidade é bem parecida. As duas formam uma via, rota, produto, obra e criação. A conquista desde o chão exige que o escalador faça a escalada do trecho jogando com os elementos que a rocha expõe e que ele dispõem. Pode ser em livre ou artificial. Em livre hoje é o ideal, utilizando o artificial para fazer as proteções fixas ou testar peças. Mas também podem ser conquistadas vias essencialmente de escalada estilo artificial. Já equipar uma via não exige esse mesmo jogo com a rocha, com seus elementos e os equipamentos e técnicas disponíveis. Exige também boa leitura da rocha - ainda mais que na conquista - para colocar as proteções em bom lugar.
Independente de tudo isso, nos dois casos, existe a criação de uma rota de escalada que se torna pública. Muito pelo contrário do que alguns pregam por ai, a criação de uma via (por conquista ou equipagem) não torna aquele pedaço de rocha seu, de sua propriedade. Na maioria dos casos, em lugares abertos, privados e públicos, uma via criada é um ato de publicação daquele pedaço de rocha. Ele se torna de todos, de uso comum. Se alguém teve o direito de escalar algum trecho de rocha em um lugar aberto ao público, todos têm o direito de escalar aquele trecho. Há, é claro, um respeito (questão de ética) ao que passou primeiro, aos primeiros ascensionistas...são muitos os documentos brasileiros que tratam da questão do "Direito Autoral". De acordo com o "Código Brasileiro de Ética na Escalada", por exemplo:
"Dos Pontos De Segurança (Grampos Fixos ou Chapeletas)
Durante uma conquista deve ser observado o posicionamento dos pontos de segurança, de modo que em hipótese alguma de queda, o escalador toque o solo, arestas ou saliências, representando perigo à sua própria integridade;
É proibida a adição de pontos de segurança em escaladas já conquistadas, sem autorização dos conquistadores;
Em caso de regrampeação os escaladores não possuem poder algum para descaracterizar qualquer rota, transferindo a original proteção dos pontos de segurança, de acordo com o artigo primeiro anterior;
É proibida a adição de pontos de segurança em escaladas já conquistadas, sem autorização dos conquistadores;
Em caso de regrampeação os escaladores não possuem poder algum para descaracterizar qualquer rota, transferindo a original proteção dos pontos de segurança, de acordo com o artigo primeiro anterior;
Da Conquista:
Nenhum escalador possui o direito de reservar para si qualquer rota ou pedaço de pedra, somente se estiver colocando evidentes esforços para efetuação de seus objetivos, seja aproximação, ou colocação de grampos;
Em caso da modificação das intenções o escalador tem a responsabilidade de expressá-las à comunidade local, deixando-a aberta a todos;
Em caso da modificação das intenções o escalador tem a responsabilidade de expressá-las à comunidade local, deixando-a aberta a todos;
Toda conquista deverá ser divulgada no catálogo que deve ser editado anualmente;" (Código Brasileiro de Ética na Escalada, 1993, grifos nossos)
A "reserva" de um trecho é também um respeito aos conquistadores, pelo esforço empreendido na aproximação (criação de trilhas, negociação com donos de terras etc.) mas tem um limite. Uma via abandonada durante anos é claramente uma modificação de intenções dos escaladores e deve ser liberada para que outras cordadas possam usufruir do que é público, no sentido de ser de todos: o direito à escalada (lembrando o "Walls are meant for climbing" da campanha da marca The North Face" e toda a luta do direito ao acesso aos picos de escalada no mundo todo)
Abandonar a ideia de que a conquista ou equipagem de uma via torna aquele trecho de rocha "seu" é fundamental para a formação de um montanhismo mais democrático. Menos ditatorial. Abrir uma via é publicar, no sentido de tornar público, para todos os que se dispuserem a encarar o que encarou o conquistador, respeitando a obra, não a modificando.
Abraços, André.
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